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EXMº SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA 33ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DA CAPITAL

 

 

 

 

 

 

 

 

 

NONONO, nos autos do Pr....., vem pela Defensoria Pública apresentar as suas

 

ALEGAÇÕES FINAIS

nos termos seguintes.

 

Conforme versa a denúncia, no dia 07 de fevereiro de 2002, por volta de 9:30 horas da manhã, na Rua Nonono...., a ré teria ameaçado a vítima Maria Nonono, e a teria ameaçado por "várias vezes" em outras ocasiões.

A acusação inicial capitula a conduta no art.147 na forma do art.69 ambos do CP, porém nas alegações finais o Parquet requer a forma continuada para o concurso de crimes: art.147 na forma do art.71, ambos do CP (fls. 78 e 79).

 

1. BREVE HISTÓRICO.

Os autos em questão provêm do Juizado Especial, onde o M.P. entendeu tratar-se de contravenção de perturbação do sossego e requereu designação de audiência preliminar (fls.15), mas a ré não foi encontrada.

O Ministério Público então ofereceu denúncia, mas pelo crime de ameaça, com proposta de suspensão apesar do imputado concurso material, porém não se conseguiu citar a ré, sendo os autos encaminhados à livre distribuiçao a uma das varas criminais.

Neste Juízo, a Promotoria de Justiça ratificou aquela denúncia já havida nos autos, que foi recebida em 30/7/2002, e a ré foi citada por edital, fls.36, 36-verso e 37.

A ré peticionou nos autos por advogado particular, fornecendo o seu endereço, e foi designada audiência especial para proposta de suspensão, fls.44, 54 e 54-verso, do que foi intimada em cartório às fls. 55.

A ré não compareceu, foi informado pelo patrono que em razão de doença de sua mãe, fls.56, designando-se nova data às fls.60, mas certificou o Sr.Oficial de Justiça que a ré não era conhecida no endereço fornecido, fls.62-verso, sendo esclarecido às fls.66 que ela deixou de residir no local desde outubro/2002.

Procurada em outro endereço, também não encontrada a acusada, fls.67-verso, dando-se seguimento ao processo.

 

2. NULIDADE ABSOLUTA. Ilegitimidade ad causam do M.P: ausência de representação.

Não há nos autos a representaçao da ofendida, mesmo que de modo informal no R.O, tanto que a autoridade policial despachou no sentido de ser esta providenciada, às fls. 07, pelo que falta condição para o exercício da ação penal pelo Ministério Público, haja vista o que dispõe o parágrafo único do art. 147 do CP.

 

3. INÉPCIA DA DENÚNCIA. Não descrição dos crimes que comporiam o concurso de crimes, em suas circunstâncias e em seu número. Cerceamento de defesa.

Prima facie avulta a precariedade da denúncia porque não é informado em que consistiu o mal injusto e grave concernente à ameaça do dia 07/02/02, fato principal, e, também, ao acusar a ré em concurso material de crimes sem individualizar, também quanto aos outros fatos, todas as circunstâncias que os comporiam, afirmando apenas que a acusada "vem" ameaçando a vítima por telefone, de quebrar a sua cara.

Portanto, quando sustenta o Ministério Público que a denunciada praticou o delito várias vezes, na verdade nada mais faz que tão somente afirmar que a denunciada incidiu outras vezes no mesmo tipo objetivo, deixando de fornecer os outros fatos nas suas individualidades e circunstâncias.

Este o cerne da questão: a não-individuação dos fatos conexos e das suas circunstâncias, tendo a ré sido denunciada de forma genérica e aleatória, porque teria incidido no mesmo tipo legal outras vezes sem que se diga como foi e quando foi que isso ocorreu.

Isso inviabilizou o pleno exercício da defesa, ante a impossibilidade de identificar a pretensão acusatória.

Outrossim, a quantidade de crimes repercute na consideração do quantum a ser adotado para aumento pela continuidade, já que este é determinado pela quantidade de delitos, sendo inviável a aplicação desta causa de aumento.

Não obstante, é necessária a representação também quanto a estes crimes.

Assim, é inepta a denúncia e sobre seus termos não pode ser proferida sentença condenatória.

 

4. NO MÉRITO.

4.1. Ausência do dolo

Sabido é que não é qualquer ameaça que configura o crime do art.147 do CP, mas somente aquela consistente em causar à vítima um "mal injusto e grave", que, segundo Agnes Cretella, deve ser realizável, verossímil e não fantástica ou impossível ("Ameaça", in RT 470/301), o que impõe que deve provir de ânimo calmo e refletivo (STF, RTJ 54/604; TACr SP, RJDTACr 15/36, Julgados 87/272, RT 534/375).

Portanto, o crime de ameaça exige o dolo específico de infundir medo; não a configura a proferida em momento de ira (TAMG, RCr 1.228, j. 28.03.85; TACr SP, RT 698/355, 603/365, Julgados 81/363, 70/335) ou de nervosismo (TACr SP, RJDTACr 15/36).

Como observado, não consta da denúncia qual o mal injusto e grave ameaçado pela ré por ocasião do fato, constando, de forma não vinculada ao fato narrado, que em outras ocasiões a ré teria dito à vítima que iria "quebrar a sua cara".

A instrução não auxiliou a alucidar o fato, pois a vítima sequer se lembrou se na data de 07/2/2002 encontrou a ré, reportando-se no seu depoimento a outras ocasiões de forma genérica, e o porteiro do fato também faz referências generalizadas, fls. 77 e 76.

A vítima havia declarado no Inquérito Policial que na véspera do ano novo Eliane foi ao encontro de Marcelo no prédio onde moram, quando foi chamada uma patrulha da P.M. para conduzir Eliane à Delegacia, mas seu filho acalmou os ânimos e pediu que a mesma fosse liberada.

De tudo vê-se que se Eliane quisesse realmente fazer o mal não escutaria nem o ex-namorado, mas entretanto Marcelo sempre teve êxito em controlá-la em todas as situações de desespero da mesma, sem que fosse necessário nenhum tipo de força externa para essa contenção.

Assim, a par de não estar provada a materialidade do fato, de toda sorte não há como se falar em dolo de ameaça, seja pelo estado de total descontrole emocional da acusada, seja porque as circunstâncias demonstram que em verdade a ré não tencionava efetivar o que dizia, estava fazendo meramente uma chantagem emocional, para que a mãe de Marcelo não impedisse aproximar-se do ex-namorado.

 

4.2 Desclassificação para a contravenção de perturbação do sossego.

Conforme já trazido, o Ministério Público junto ao Juizado Especial inicialmente entendeu tratar-se de contravenção de perturbação do sossego, artigo 42 do Dec. Lei 3688/41, mas entendemos que tal tipo tem por sujeito passivo a coletividade, e seria portanto mais apropriado o artigo 65 da LCP, perturbação da tranqüilidade: "molestar alguém ou perturbar-lhe a tranquilidade, por acinte ou por motivo reprovável".

 

5. DA SUBSTITUIÇÃO DA PENA RESTRITIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITO E DO SURSIS PENAL.

A ré é primária e de bons antecedentes, já que a única anotação da FAC teve resultado de arquivamento, conforme fls. 51 e 52, e são-lhe favoráveis as demais circunstâncias do art.59. Portanto, em caso de condenação, o que só por argumentação admite-se, a sua pena deve ser definida no mínimo legal.

Outrossim, sendo a escala penal de um a seis meses de reclusão, caberá a substituição por pena alternativa qualquer que seja a pena aplicada, nos termos do art.44 do CP, como também o sursis penal.

 

6. CONCLUSÃO.

PRELIMINARMENTE, requer seja declarada a nulidade ab initio do processo, pela ilegitimidade ad causam do Ministério Público ante a decadência do direito de representação da ofendida.

NO MÉRITO, requer a absolvição da acusada com fulcro no inciso III (terceiro) do art. 386 do CPP, e, caso não seja este o entendimento de V. Exa., a desclassificação para o art.65 da LCP, com aplicação da pena no patamar mínimo legal e sua substituição por pena restritiva de direito, conforme art.44 do CP.

 

Termos em que pede deferimento.

Rio de Janeiro, 12 de maio de 2.003.

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